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Há exatos 130 anos, o município de Penha do Rio do Peixe sofria uma mudança político-administrativa muito importante e passava a se chamar Itapira.

Foi no dia 1º de abril de 1890 que o então governador de São Paulo e futuro presidente da República, Prudente de Moraes, assinou o Decreto Nº 40, oficializando a alteração do nome da cidade.

Nesta quarta-feira, primeiro dia de abril de 2020, o marco é lembrado e explicado pelo historiador Eric Apolinário, responsável pelo Museu Histórico de Itapira.

“Em 2020 Itapira comemora oficialmente seu bicentenário, mas além desta data marcante outra data importante é comemorada: os 130 anos da mudança do nome da cidade”, diz em entrevista ao Itapira News.

Ele lembra que a mudança do nome da cidade teve relação direta com o famoso ‘Crime da Penha’ – como ficou conhecido o brutal assassinato do delegado Joaquim Firmino de Araújo Cunha, atacado dentro de casa por escravagistas locais na madrugada do dia 11 de fevereiro de 1888. Em 13 de maio do mesmo ano, a princesa Isabel assinava a Lei Áurea, decretando a libertação de todos os escravos.

“O acontecimento ganhou notoriedade na imprensa regional e em poucos dias era conhecido por todo o Império Brasileiro. O Crime da Penha deixou marcas negativas tão profundas ligadas ao nome da cidade, Penha do Rio do Peixe, que pouco menos de dois anos após esse fato a Câmara Municipal entrou com um pedido ao então governador de São Paulo, Prudente de Moraes, solicitando a mudança de nome da cidade”, explica Apolinário.

Eric Apolinário detalha período sombrio da história local (Divulgação)
  • PRESIDENTE DA CÂMARA ACUSADO

Segundo ele, um dos fatos mais intrigantes relacionados a esse período da história itapirense é que o principal idealizador do projeto foi o então presidente da Câmara Municipal – que naquela época tinha seu cargo equiparado ao de prefeito nos dias atuais – John Jackson Klink.

Conhecido como João Klink, o homem nascido nos Estados Unidos imigrou para o Brasil depois de lutar na famosa Guerra Civil Americana, apoiando escravagistas do Sul do País pelo Exército Confederado. E, na então Penha do Rio do Peixe, conseguiu obter importante posição política e social.

“Ocorre que João Klink foi um dos acusados de matar o delegado Joaquim Firmino, chegando a ser julgado e absolvido, juntamente com mais de uma dezena de outros acusados, todos escravagistas locais. O motivo apresentado pela Câmara Municipal da Penha do Rio do Peixe, através de seu presidente, para a mudança do nome é sem dúvidas questionável e até mesmo difícil de ser digerido, alegando-se apenas que o nome ‘Penha do Rio do Peixe’ trazia muita vergonha para os moradores locais”, conta Eric Apolinário.

De acordo com ele, Klink alegava que a ‘Penha’ estava marcada de maneira muito negativa no cenário nacional. “Aproveitando as mudanças ocorridas com o fim da Monarquia e a proclamação da República em 1889, o clima era perfeito para uma solicitação de tamanha importância como aquela”, frisa.

Assassinato de Joaquim Firmino foi estopim para mudança de nome da cidade (Divulgação)
  • ORIGEM     

O pesquisador e historiador lembra que, desde os primeiros povoamentos de portugueses na nossa região, a localidade que viria a se tornar Itapira recebeu alguns nomes: bairro dos Macucos, Vila de Nossa Senhora da Penha de Mogi Mirim, chamada também em muitos documentos oficiais de ‘Penha de Mogi’ ou ‘Penha de Mogi Mirim’.

Mas foi em 20 de abril de 1871 que a localidade se tornou, enfim, um município, recebendo o nome de Penha do Rio do Peixe. Hoje, ‘Penha do Rio do Peixe’ é nome de populoso bairro da cidade e uma homenagem ao antigo nome do município.

“Durante muitas décadas, memorialistas e pesquisadores discordaram inúmeras vezes sobre as origens do nome Itapira. O que se pode afirmar, através de fontes documentais é que o nome Itapira já era conhecido na primeira metade do século XIX devido a uma fazenda com este nome existente na localidade. Mesmo assim, até o ano de 1890 a palavra Itapira nunca foi diretamente ligada ao município”, ressalta Apolinário.

Ele enfatiza que, apesar de tantas explicações sobre a tradução da palavra Itapira – cuja origem se remete à língua Tupi-Guarani – naqueles dias de 1890, quando os políticos e ex-escravagistas locais decidiram pela mudança do nome, “é de se duvidar que houve algum tipo de preocupação aprofundada sobre tais origens e significados”.

“Nossa cidade se chama Itapira, simplesmente porque houve em 1890 e nos anos seguintes, uma tentativa eficiente de se apagar acontecimentos passados. Eficiente sim, porque nas décadas e gerações seguintes, muito pouco se falou sobre aquele assassinato, ou sobre os reais números de escravos vivendo em nossa cidade durante grande parte do século XIX”, afirma.

Trecho de ata do presidente da Câmara sobre o decreto do governador que autorizou mudança (Divulgação)

Autor do livro ‘Inverno Escarlate – Vida e Morte nas Trincheiras do Front Leste’, Eric Apolinário agora trabalha em uma nova obra justamente focada no período escravagista na cidade da Penha do Rio do Peixe e na região. O livro tem previsão de publicação para 2021.

Segundo o escritor, ‘O Crime da Penha’, título da obra, contará com dezenas de documentos e evidências inéditas sobre o caso, além de informações preciosas sobre o cotidiano da cidade naquele período.

“O Crime da Penha não terminou em 1890, com a mudança do nome da cidade e a tentativa de apagar a história. Ele continuou por décadas, através de seus principais personagens. A vida na cidade de Itapira continuou, a cidade entrou no século XX carregando uma bagagem muito pesada envolvendo a escravidão, mas ao mesmo tempo, recebendo influências culturais incríveis de toda uma população marginalizada, resistente até os dias de hoje”, finaliza.

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